23 de abril de 2012

FORMA E CONTEÚDO



Ontem eu estava assistindo a Acossado (à bout de souffle) de Jean-Luc Godard. É curioso. Vivemos em uma época de extremos. Procura-se pela forma ou pelo conteúdo, nunca pelo equilíbrio entre estes dois elementos.

Talvez este fenômeno esteja ocorrendo há décadas e minha divagação seja inexpressiva, mas como o senso de percepção funciona de maneira incompreensível, gostaria de abordar este tema.

A forma não sobrevive sem o conteúdo e o contrário também é verdadeiro. Vamos analisar um exemplo simples: Amy Winehouse. Sua vida recente foi abordada de forma bastante clara, uma espécie de Big Brother trágico (termo que eu li na Folha de S. Paulo e se adéqua bem ao caso) cujo final, apesar de ter causado comoção e surpresa, sempre foi bastante óbvio. Forma, abordagem, sensacionalismo. Uma idéia bastante clara.

Falta conteúdo. Drogas, festas, polêmicas e comportamento inadequado em público... Situações bastante insignificantes e irrelevantes, se partirmos do princípio humano. No caso, a falta de conteúdo maior veio do público.

Após sua morte, praticamente todas as emissoras fizeram seu especial. Ali o conteúdo transbordava. A diva que fez renascer um gênero abandonado, deixado às traças por diversas gerações. Sua voz, seu desempenho, sua importância em meio ao mundo artístico, sua conexão com o público, sua luta pessoal. E a forma? Imagens de arquivo, linguagem nostálgica, emotiva. Uma espécie de documentário sobre superação mesclado a uma palestra de auto-ajuda. Convenhamos: papo pra boi dormir, como diriam os mais velhos.

Esta falta de conexão entre forma e conteúdo torna a arte estritamente artificial. Obviamente, um filme é artificial. Película, câmeras, cenários... Tudo construído, nada provido. Mas a conexão com o público a torna verdadeira. Pelo menos, em sua essência.

Vivemos nós em um mundo onde forma e conteúdo devem permanecer separados? Nosso cinismo chegou a este nível? Ou vivemos em um mundo onde nossa ótica perdeu-se em meio a este emaranhado de imagens insignificantes que definem nossas vidas?

Se o problema surgiu por meio da ignorância e da preguiça, menos mal. É contornável.

Se tornou-se nossa alternativa pela simples razão de que é assim que querem os profissionais e é assim que quer a audiência, o problema intensifica-se. Como diria Sidney Lumet referindo-se a seu Rede de Intrigas (network): “A televisão não corrompe as pessoas. Pessoas corrompem pessoas”.

Certo ou errado, eu temo por, diante disto tudo, não saber exatamente de que lado se encontra a verdade.

Se é que ela ainda existe ou, ao menos, é relevante.

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