Ontem
eu estava assistindo a Acossado (à bout de souffle) de Jean-Luc Godard. É
curioso. Vivemos em uma época de extremos. Procura-se pela forma ou pelo conteúdo,
nunca pelo equilíbrio entre estes dois elementos.
Talvez
este fenômeno esteja ocorrendo há décadas e minha divagação seja inexpressiva,
mas como o senso de percepção funciona de maneira incompreensível, gostaria de
abordar este tema.
A
forma não sobrevive sem o conteúdo e o contrário também é verdadeiro. Vamos analisar
um exemplo simples: Amy Winehouse. Sua vida recente foi abordada de forma
bastante clara, uma espécie de Big Brother trágico (termo que eu li
na Folha de S. Paulo e se adéqua bem
ao caso) cujo final, apesar de ter causado comoção e surpresa, sempre foi
bastante óbvio. Forma, abordagem, sensacionalismo. Uma idéia bastante clara.
Falta
conteúdo. Drogas, festas, polêmicas e comportamento inadequado em público...
Situações bastante insignificantes e irrelevantes, se partirmos do princípio
humano. No caso, a falta de conteúdo maior veio do público.
Após
sua morte, praticamente todas as emissoras fizeram seu especial. Ali o conteúdo
transbordava. A diva que fez renascer um gênero abandonado, deixado às traças
por diversas gerações. Sua voz, seu desempenho, sua importância em meio ao
mundo artístico, sua conexão com o público, sua luta pessoal. E a forma? Imagens
de arquivo, linguagem nostálgica, emotiva. Uma espécie de documentário sobre superação
mesclado a uma palestra de auto-ajuda. Convenhamos: papo pra boi dormir, como
diriam os mais velhos.
Esta
falta de conexão entre forma e conteúdo torna a arte estritamente artificial. Obviamente,
um filme é artificial. Película, câmeras, cenários... Tudo construído, nada provido.
Mas a conexão com o público a torna verdadeira. Pelo menos, em sua essência.
Vivemos
nós em um mundo onde forma e conteúdo devem permanecer separados? Nosso cinismo
chegou a este nível? Ou vivemos em um mundo onde nossa ótica perdeu-se em meio
a este emaranhado de imagens insignificantes que definem nossas vidas?
Se
o problema surgiu por meio da ignorância e da preguiça, menos mal. É contornável.
Se
tornou-se nossa alternativa pela simples razão de que é assim que querem os
profissionais e é assim que quer a audiência, o problema intensifica-se. Como diria
Sidney Lumet referindo-se a seu Rede de
Intrigas (network): “A televisão
não corrompe as pessoas. Pessoas corrompem pessoas”.
Certo
ou errado, eu temo por, diante disto tudo, não saber exatamente de que lado se
encontra a verdade.
Se
é que ela ainda existe ou, ao menos, é relevante.
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