26 de junho de 2012

DREDD


Um novo episódio de G.I. Joe e o reboot da origem do Homem-Aranha não são suficientes. Hollywood decretou que 2012 seria o ápice de sua falta de criatividade. Desta forma, que melhor momento para tentar recuperar alguns fracassos do passado? Apostas ganhas que naufragaram nas bilheterias?

Dredd (idem) torna-se o primeiro passo.

Não que eu tenha nada contra o personagem criado por John Wagner e Carlos Ezquerra. A visão futurista e caótica de uma cidade onde a polícia age como lei, júri e juiz, espelham um universo apocalíptico bastante explorado por artistas dos quadrinhos entre os anos 70 e 80. Aliás, o belíssimo visual imposto pelas histórias deveria resultar também em belas imagens.

Não foi o que aconteceu em 1995.

O Juiz (judge Dredd), protagonizado por Sylvester Stallone, foi mais um dos muitos equívocos constrangedores produzidos por um grande estúdio.

Curiosamente, Hollywood não costuma corrigir seus erros. Não costuma analisar o que deu errado no intuito de procurar uma abordagem diferenciada. Na verdade, há uma insistência religiosa em sua fórmula datada que, na maior parte das vezes, funciona, é bem verdade. Ao menos na questão financeira.

Pelo trailer, é possível dizer que esta nova versão corre um risco tremendo de ser ainda pior que a anterior.

Abaixo segue o link.

http://www.imdb.com/title/tt1343727/videogallery

25 de junho de 2012

FUNNY GAMES


Eu demorei, mas após um esforço tremendo, finalmente consegui compreender.

As linhas acima não fazem muito sentido, é bem verdade, mas o conteúdo abaixo irá complementá-la.

O diretor austríaco Michael Haneke teve a oportunidade de filmar uma nova versão de Violência Gratuita (funny games), obra de 1997 que deu reconhecimento internacional ao realizador e lhe rendeu uma indicação à Palma de Ouro do Festival de Cannes.

Procedimento bastante recorrente nos EUA: filmar em seu próprio solo produções de outros países. O gênero terror abasta a criatividade de Hollywood há anos.

O que eu jamais entendi, é porque Haneke decidiu utilizar o mesmo roteiro, os mesmos diálogos, os mesmos enquadramentos, os mesmos movimentos de câmera e a mesma disposição de objetos. Foi o mesmo filme com outros atores.

A resposta é bastante óbvia.

Violência Gratuita é possivelmente a obra mais incisiva como crítica à violência de entretenimento. E esta fórmula mágica, presente em filmes como Duro de Matar (die hard) até Jogos Mortais (Saw) abastece os cofres da indústria cinematográfica há mais de 100 anos. E nasceu lá, na América do Norte.

O filme de Haneke mostra como esta forma de violência é uma perversão, uma afronta à realidade. Até mesmo o aspecto cômico, muito explorado por Quentin Tarantino (apenas para citar um exemplo) é desconstruído, principalmente em sua metalinguagem.

Violência Gratuita nos relembra que não existe nada de divertido na violência. Utilizando uma abordagemincômoda, quase masoquista, a história, que apresenta um mínimo de imagens chocantes, agride o espectador de forma tão angustiante que é necessário descobrir quantos têm estômago para permanecer até o final da sessão. Em um determinado momento, um dos personagens diz “Por que você não nos mata e acaba logo com isso?” um dos torturados (se é que este é mesmo o termo adequado) olha para a câmera e diz “Ora, nós queremos uma história com trama, começo meio e fim. Não é mesmo?”.

E, infelizmente, é isso que nós queremos. Entretenimento na maior parte do tempo. Sorrir para não refletir. A banalização da violência é o ponto culminante de uma civilização que consegue anestesiar o ser humano ao seu extremo, levá-lo a um local onde tudo é tão distante que até mesmo a morte pode ser divertida.

Por isso ele não alterou nenhum detalhe em sua nova versão. Foi sua maneira de dizer “Vocês querem ganhar dinheiro e tornar minha maior crítica ao entretenimento no próprio mal que eu combato? Preparem-se para uma surpresa”.

O filme custou 20 milhões de dólares e rendeu apenas um.

Pode uma crítica ser mais direta?


TOP TEN


A Pixar estréia na primeira posição com Valente (idem) que deve adentrar os cinemas brasileiros no dia 20 de Julho. É um fato corriqueiro para o grupo que produziu as melhores animações, recebeu os prêmios mais importantes e detém as melhores bilheterias. A novidade talvez seja um personagem feminino como protagonista em uma história que se assemelha às fábulas. Não tanto fábulas infantis, mas histórias folclóricas, tal qual a abordada em Como Treinar seu Dragão (how to train your dragon). A recepção foi muito boa e os números bastante razoáveis para um ano surpreendentemente fraco em questões monetárias dos espectadores norte americanos.

Por esta razão, Os Vingadores (the avengers) merece uma atenção especial. O filme está muito próximo de se tornar a segunda maior bilheteria nos EUA. Semana que vem deveremos ter a marca de 600 milhões de dólares impostas por Titanic (idem) em 1998, quebrada pela segunda vez. Nos números globais a tarefa é praticamente impossível, mas devemos nos recordar que apesar de ter nascido para abocanhar a maior fatia possível de público, Os Vingadores está longe de ter o apelo de Titanic. Pelo menos no universo feminino.

Outra surpresa é Branca de Neve e o Caçador (Snow White and the huntsman) que alcança um sucesso maior que os esperado.

Homens de Preto 3 (MIB III) e Prometheus (idem) mantém-se com bons números e a bilheteria somada deve pagar os gastos. Particularmente, a obra de Ridley Scott teve boa recepção de crítica e público e talvez seja lembrada pelo Oscar, ao menos nos quesitos técnicos.

Madagascar 3 (Madagascar 3: Europe`s most wanted) avança como o episódio forte da franquia. Após duas semanas no topo das bilheterias, perdeu a posição para Valente, mas permanece como a animação mais assistida de 2012.

A grande decepção ficou por conta de Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros (Abraham Lincoln: vampire hunter) de Timur Bekmambetov. O realizador de O Procurado (wanted) viu seu novo trabalho com renda inferior aos 17 milhões, lembrando que da primeira para a segunda semana os valores costumam cair em 50%. Provavelmente os 70 milhões investidos passarão longe dos bolsos de seus investidores.


21 de junho de 2012

VENDREDI SOIR


O cinema francês é recheado de diálogos. A impressão que se tem, assistindo à maior parte dos filmes vindos de lá, é a de que tudo ruma para a filosofia, ou para o amor. Um copo vazio não é somente um copo vazio, mas um universo repleto de angústia. Ou pode também significar uma mulher submissa a regras sociais buscando sua verdadeira paixão.

Ou não.

Brincadeiras à parte, o aspecto dos diálogos é verdadeiro. Mesmo os grandes mestres, Renoir, Godard, Truffaut, Resnais, Rohmer, admitiam uma aderência cultural bastante precisa. Ou seja: definir as características marcantes do povo francês, um povo que dialoga continuamente.

Talvez por esta razão o cinema de Claire Denis seja tão curioso.

Vendredi Soir (sem título em português) é, possivelmente, sua obra-prima e talvez o melhor exemplo de sua abordagem.

Mesclando lirismo e imagens repletas de musicalidade, a trama caminha entre poesia e sinfonia e dá igual importância a personagens e cenários. Já em sua introdução, Paris é apresentada com a Torre Eiffel ao fundo. No entanto, o visual não se assemelha ao de um cartão postal. As casas, os fios e a sujeira das paredes praticamente ofuscam o símbolo máximo da cidade luz. A névoa permite apenas uma silhueta da Torre, tornando-a praticamente insignificante diante do quadro como um todo. É uma visão de cima, mas em sua elevação, praticamente horizontal. Vagarosamente as imagens desconstroem nossa idéia do que seria a capital francesa.

Este elemento é essencial.

O filme conta a história de Laure, uma mulher próxima dos quarenta anos que está empacotando seus pertencentes para ir morar com seu namorado. É noite de Sexta-feira e ela é convidada para jantar com um casal de amigos. Há uma greve geral no transporte público e o trânsito está um caos. Está frio. Ela decide dar carona a um homem, uma sugestão da rádio local para acomodar transeuntes nesta situação atípica.

Utilizando uma sensibilidade bastante aguda, a diretora rege o início de um relacionamento entre dois estranhos nesta noite particularmente incomum. Os diálogos são mínimos, os gestos e as expressões nos dizem tudo. Como escreveu Robert McKee: “Não conte, mostre”.

Devo dizer que ele tem razão.

O manuseio das imagens e a belíssima trilha sonora transportam os personagens a um universo mágico. Suas reações nos revelam o aspecto maravilhoso, distante do melodramático, citado primeiramente por Aristóteles.

A sequência onde Laure sai de seu quarto para buscar um cinzeiro é particularmente tocante. Existe muito em comum entre estes dois novos amantes.

Pelo menos pelo espaço de um dia, o mundo parou de girar para contemplar o amor dos dois.

Infelizmente, minha cópia foi, digamos, adquirida de forma genérica. Talvez se os distribuidores brasileiros tivessem o mínimo de preocupação em tentar abranger o gosto do público a situação das videolocadoras não estivesse tão caótica.

Das videolocadoras e do cinema nacional.

Pelo menos dos filmes que estréiam sem nosso conhecimento.


19 de junho de 2012

THE MASTER - NOVO TRAILER


Às vezes eu me repito.

Não tanto quanto se repetem os filmes de ação ou as comédias românticas, mas certamente escrevo mais que o necessário sobre determinados filmes. Mais e muitas vezes. Django Livre (Django unchained) de Quentin Tarantino, por exemplo, recebeu três colunas. O Cavaleiro das Trevas Ressurge (the dark knight rises) e Os Vingadores (the avengers) outras duas, assim como Moonrise Kingdom.

Talvez exista um demasiado cinismo de minha parte, mas eu espero cada vez menos da maior parte das produções e cada vez mais de um seleto grupo. Um dos realizadores que encabeça este grupo é Paul Thomas Anderson.

The Master (idem) foi citado neste blog em outras duas ocasiões. O primeiro trailer deixava claro que parte da espinha dorsal narrativa se daria sobre um evento passado o qual o protagonista não recorda. Mais do que isso: aparentemente ele não receberia esta informação de presente, mas teria de batalhar por ela. Ou seja, o espectador sabe menos que os próprios personagens, elemento típico de uma tragédia.

O fator curioso deste segundo trailer (disponibilizado hoje) é tentar encontrar um gancho que o una ao anterior. O personagem que dá origem ao título, interpretado por Philip Seymour Hoffman, é apresentado. No entanto, o único elemento em comum é Joaquin Phoenix, o protagonista que não se recorda do evento citado.

Poucas vezes um filme deste porte recebeu uma divulgação tão original.

Vale à pena assistir algumas vezes. Tanto a trilha quanto a linguagem adotada merecem determinada atenção.

Abaixo deixo o link dos dois trailers.

http://www.imdb.com/title/tt1560747/videogallery

18 de junho de 2012

MOONRISE KINGDOM


Muitas pessoas não entendem como Wes Anderson consegue filmar.

Não pelo aspecto técnico, afinal, é um grande realizador. Poucos diretores utilizam cada centímetro do fotograma de forma tão precisa quanto ele.

Também não pela qualidade de seus trabalhos. É querido pela crítica e tem seu público fiel. Seleto, mas entusiasta.

O fato é que seus filmes, pelo menos em termos de bilheteria, nunca rendem o suficiente para fazer valer um investimento. Existem vendas de Blu-Ray e DVD, os contratos televisivos (das emissoras fechadas e abertas), que, possivelmente, devem cobrir os custos.

De qualquer maneira, fico feliz que ele consiga finalizar uma obra a cada dois anos.

Moonrise Kingdom, ainda sem título em português e sem data de estréia no Brasil, está na lista dos dez mais assistidos há três semanas. Sempre em posições modestas, mas é um ganho. Surpresas como Cisne Negro (black swan) e Meia Noite em Paris (midnight in Paris), disputaram posições com superproduções e, em determinadas situações, estiveram à frente.

Eu creio que hoje, existam duas curiosas novas vertentes no cinema. A Europa praticamente dobrou seu público em filmes da linha Velozes e Furiosos (the fast and the furious) e Piratas do Caribe (pirates of the Caribbean). Os EUA perderam espectadores neste quesito, mas compensam em produções modestas de grande valor artístico.

Uma reviravolta curiosa que pode demonstrar a força e a qualidade do cinema independente norte americano.

14 de junho de 2012

HUGO


“Venham sonhar comigo”.

Esta frase dita por Ben Kingsley no papel de Georges Méliès não conclui A Invenção de Hugo Cabret (Hugo), mas capta sua essência. O cinema, antes de mais nada, é uma jornada em busca do fantástico.

Méliès foi o primeiro realizador a perceber este fato. Somos todos contadores de história. O que o difere dos demais, é a abordagem e o toque pessoal. Centenas (talvez milhares) de cineastas aprenderam esta lição.

Hoje, 116 anos após o surgimento de seu primeiro filme, nada mudou. Ou melhor, tudo mudou, mas a essência permanece. As regras foram modificadas, não os princípios. O cinema continua sendo a arte de contar uma história. “24 mentiras por segundo a serviço da verdade”, como bem definiu Michael Haneke.

A Invenção de Hugo Cabret é uma sensível homenagem à sétima arte e também a um de seus maiores realizadores. Somente neste universo é possível compreender como o homem por trás de Taxi Driver (idem), Touro Indomável (raging bull) e Os Bons Companheiros (goodfellas) é capaz de inserir em sua extensa obra uma fábula infantil.

Martin Scorsese é um grande observador. Ao contrário do deslize ocorrido em Gangues de Nova Iorque (gangs of New York), aqui o casamento entre fotografia, direção de arte, figurino, maquiagem e efeitos visuais, realmente respeita a frase “até que a morte os separe”. Vai além, pois os grandes filmes não morrem, apenas amadurecem.

Hugo é um garoto que vive em uma estação de trem em Paris na primeira metade do século XX. Órfão e esquecido pelo tio que prometeu ficar ao seu lado, caminha pelas tubulações do local mantendo os mecanismos em ordem para que ninguém suspeite de sua presença e o mande a um orfanato. Guarda, em seu pequeno e improvisado cubículo, um estranho autômato que, supostamente, deveria escrever, quando funcionando. Hugo passa seus dias procurando a solução para ativá-lo, pois acredita que seu pai, antes de falecer, lhe deixou uma mensagem secreta neste estranho objeto. O garoto consegue consertar o autômato, mas precisa de uma chave em forma de coração para que ele funcione corretamente.

A história tem início.

Na verdade, o boneco simboliza o próprio Georges Méliès, abandonado em uma velha loja de brinquedos. Ele, como um objeto defeituoso, necessita de uma chave que reative seu próprio coração. A história deste cineasta é bastante triste. Esquecido após a primeira guerra mundial, tombou diante do alcoolismo e precisou vender seus filmes para poder pagar diversas dívidas. Estes filmes foram derretidos e transformados em saltos de sapatos femininos. A humanidade, literalmente, passou a pisar em sua obra. Somente ao final de sua vida ele foi relembrado e recebeu os devidos méritos.

Scorsese, de maneira bastante respeitosa, ignora os problemas com o álcool e decide passar ao espectador a imagem do artista. A beleza das cenas às vezes não procura uma conexão direta com a história. O cinema, afinal, pode ser apenas a beleza, em sua forma mais pura.

Em um determinado momento, Hugo diz a seguinte frase: “Os grandes mecanismos nunca vêm com peças sobressalentes. Sua perfeição é tanta que toda a engrenagem tem uma função essencial. Eu gosto de imaginar que o mundo é um grande mecanismo, assim eu teria uma razão para estar aqui”. Em outro, Méliès diz o que poderia ser seu complemento: “Eu construí este autômato com peças que sobraram de uma de minhas invenções”.

O autômato, ao final, curou a dor de Méliès, deu um lar a Hugo e, sob pequenos aspectos, modificou a vida de todos naquela pequena estação de trem.

Imagino que, por vezes, as peças sobressalentes fiquem fora de uma grande engrenagem, pois são importantes demais para fazer parte de um todo.

Elas são um universo à parte.

Assim como é o cinema.


12 de junho de 2012

OS PROCURADOS


Eu não gostei da série Madagascar (idem). O primeiro episódio até continha alguns elementos bastante interessantes. O fato de não apresentar um vilão específico, que não é novidade neste tipo de animação desde o pioneiro Toy Story (idem), os pinguins, que regiam sequências cômicas bastante curiosas e os lêmures, em especial o rei Julien dublado por Sacha Baron Cohen, representavam bem o fonzie, aquele típico personagem estereotipado das sitcoms que não tem uma noção definida de realidade. O Kramer das selvas. Somados, estes detalhes conseguiam criar ganchos suficientes para suportar uma trama. Os intervalos, no entanto, deixavam longas barrigas e tornavam o conteúdo geral bastante tedioso.

O segundo episódio foi aquém. Em primeiro lugar, não respeitou as regras impostas no predecessor, criando situações demasiadamente forçadas. Em segundo lugar, esqueceu que a comédia vive de situações engraçadas, não de piadas. Contar uma história seguindo uma série de esquetes, como feito em Não é Mais um Besteirol Americano (not another teen movie), por exemplo, é zombar de forma grosseira da inteligência do público. Em especial, das crianças. Para se ter uma idéia, meu filho de cinco anos não gostou do resultado. Imagino como deve ter sido para os mais velhos.

Por que fui assistir a Madagascar 3: Os Procurados (Madagascar: Europe`s most wanted)? Bom, e quem é que sabe?

Uma surpresa, no entanto. Talvez por estar acompanhado do pequeno, talvez por não criar um mínimo de expectativas, talvez por estar vivendo uma fase menos exigente, o fato é que, pasmem, eu ri. E com vontade. O filme é surpreendentemente bom. Mais do que isso, tem momentos hilários e inteligentes. Algumas passagens de mau gosto, devo dizer, mas o balanço geral é positivo.

Existem ótimas sequências de ação, personagens bem desenvolvidos, uma trama perspicaz e poucos intervalos vazios. Mesmo as passagens de cena são complementadas por situações curiosas. Talvez elas nem mesmo tenham uma contribuição para o quadro geral, mas o que isso importa? O cinema não vive somente de reflexão. O cinema vive de vontade.

Da vontade de se locomover, pagar estacionamento, um ingresso caro, aturar um sistema de som medíocre (ainda mais em filmes dublados), trânsito e muitas vezes a decepção do filho. Sua satisfação, no entanto, vale o sacrifício.

Ele saiu satisfeito, eu também.

Ao final, gostar de um filme continua sendo o fator mais importante.


AS IDAS DE MARÇO


Todos os galãs são carismáticos, cada um à sua própria maneira.

É o caso de Tom Cruise e de Harrison Ford, o eterno Indiana Jones, intacto há mais de três décadas. Existe o lado selvagem muito bem representado por Marlon Brando e James Dean, o lado tímido de Dustin Hoffman, o lado ativista de Paul Newman, a insanidade de Jack Nicholson e o multitalentoso Warren Beatty.

Como eu disse: cada um à sua maneira.

George Clooney é diferente.

Surgiu em meio a uma série de grande sucesso, conhecida por aqui como Plantão Médico (E.R). Nascer bonito pode ser proveitoso. Muitos fãs e alguns milhões depois ele, em pouco, tempo tinha o controle de sua carreira. Curiosamente, parece que ninguém apostava nisso.

Imagine-se como um galã televisivo de uma série de sucesso. Surge uma proposta no mundo do cinema. Qual a opção óbvia? Uma superprodução ao estilo James Bond? Uma comédia romântica segura? Algo de tom ecológico ou das preocupações ambientais do momento? Contra toda a lógica, Clooney aliou-se a Quentin Tarantino e Robert Rodriguez no clássico cult Um Drinque no Inferno (from dusk till dawn). Esta decisão seria o suficiente para mostrar seu diferencial.

Novamente contra a obviedade, foi além.

Entre tolices, que supostamente lhe garantiriam segurança financeira para agir da forma que bem entendesse, como Batman & Robin (idem) e O Pacificador (the peacemaker), ele, em pouco mais de uma década, trabalhou com realizadores como Terrence Malick, David O. Russell, Wes Anderson, Alexander Payne, fez uma ponta no longa-metragem South Park – Maior, Melhor e Sem Cortes (South Park – bigger, longer and uncut), talvez a animação mais controversa da história da televisão norte americana, tornou-se figura carimbada nos filmes dos irmãos Coen e de Steven Soderbergh, venceu um Oscar e aderiu a causas políticas mundo afora.

Decisões, quase sempre acertadas, tomadas em momentos corretos.

Timing é tudo.

Isso diferencia Clooney dos restantes. A maioria dos galãs e das grandes celebridades passa por um período de depressão, abuso de drogas, relacionamentos tempestuosos e brigas com a imprensa. Polêmicas em geral.

Não Clooney. Ele atendeu a todas as expectativas depositadas em seu talento. Foi além e, por esta razão, triunfou.

Arriscou-se como produtor, roteirista, diretor, enfim, um realizador completo. Dirigiu a si mesmo e recebeu os louros pelo excepcional Boa Noite e Boa Sorte (good night and, good luck).

Esta introdução foi feita para um breve comentário sobre sua mais recente obra: Tudo Pelo Poder (the ides of March).

Escrever sobre política é um risco.

Digo isso porque eu acredito honestamente que ninguém, e friso NINGUÉM sabe como funciona a política de lugar algum no mundo. Posso estar sendo um tolo em minha afirmação, mas creio piamente neste fato. Aliás, acredito que não exista um único ser humano que consiga definir de forma direta o que significa política. Pelo menos nos dias de hoje.

Mas Clooney aborda o filme da maneira correta, utilizando um artefato conhecido de todos: o âmago do ser humano.

O elenco, escolhido a dedo (em especial o fenomenal Philip Seymour Hoffman), representa de maneira concisa e sem rodeios que tudo não passa de um grande circo. Que as eleições, os debates, as expectativas, são apenas episódios isolados de um picadeiro. Infelizmente, neste quesito, os palhaços estão na platéia.

O filme não busca um tom sarcástico ou irônico. Muito pelo contrário, a abordagem é bastante madura e os diálogos, artifício típico do cinema clássico, estão meticulosamente construídos em prol da história. Afinal, o cinema, entre outras coisas, é a arte de se contar uma boa história.

Neste quesito, Clooney se diferencia dos demais.

Ele próprio é a boa história.


10 de junho de 2012

DJANGO UNCHAINED - TRAILER


Esta é a terceira coluna sobre Django Livre (Django unchained), novo filme de Quentin Tarantino, que publico em poucos dias. Assim como ocorreu com a produção de Bastardos Inglórios (inglourious basterds), aqui, tudo acontece em grande velocidade. Surge a pré-produção, as imagens, sinopse, elenco e agora já temos a data de estréia e o primeiro trailer da obra.

O filme terá seu lançamento oficial no Natal deste ano (ainda não há previsão para os cinemas brasileiros), possivelmente para poder concorrer ao Oscar 2013.

O link para o trailer está logo abaixo. Aparentemente será uma mescla de Kill Bill (idem) com Bastardos Inglórios. Um tom farsesco.

Espero que o resultado seja tão bom quanto seus predecessores.




4 de junho de 2012

BRANCA DE NEVE E O CAÇADOR


Eu não sei se este fato já pode ser considerado uma tendência, mas os clássicos estão sendo reescritos (ou reciclados) e apresentados a uma nova geração.

Não falo de clássicos como E o Vento Levou (gone with the wind), mas das histórias que nossos pais contavam na hora de dormir. Rapunzel, Chapeuzinho Vermelho, A Gata Borralheira, enfim, as fábulas da infância.

Cada um teve a sua.

Obviamente, não há nada de original nesta observação. Estas histórias utilizavam mitos e arquétipos no intuito de introduzir morais e lições de vida ao universo infantil. Desta maneira, elas existem em diversos universos em todas as formas de arte e nos discursos do dia-a-dia. Afinal, lidam com o que há de intrínseco no ser humano.

Pois Hollywood, vivendo uma fase de contraste entre a total falta de criatividade e a afirmação de realizadores notáveis como Darren Aronofsky e Paul Thomas Anderson, decidiu investir neste novo nicho. Depender de obras como Cisne Negro (black swan) para pagar as contas é muito arriscado.

Primeiramente, como é de praxe, apoiaram-se na literatura.

Os vampiros new wave, carismáticos e apaixonados conseguiram um grande espaço. A saga Crepúsculo (twilight) é uma franquia de bilhões.

Depois veio a comédia infantil Deu a Louca na Chapeuzinho (hoodwinked). Sucesso que rendeu uma continuação.

Vagarosamente, adolescentes e adultos tornaram-se o novo alvo.

A garota da Capa Vermelha (red riding hood) foi o primeiro passo. Uma releitura severa e madura da história da Chapeuzinho Vermelho. Pelo menos foi assim que pareceu aos produtores.

Funcionou no setor financeiro. O que é suficiente.

Hoje, no topo das bilheterias (à frente de Os Vingadores e Homens de Preto III) está Branca de Neve e o Caçador (Snow White and the huntsman). Nem preciso dizer a história que inspirou o filme.

Apresentando como protagonista Kristen Stewart, a Hollywood girl (sex symbol?) da vez, a história cerca-se de cenários com um visual bastante carregado.

Se a Garota da Capa Vermelha introduzia elementos sexuais, este procura a elegância das grandes batalhas, uma espécie de cruzada onírica se é que esta expressão faz algum sentido. Eu não assisti ao filme, fico devendo uma análise mais detalhada.

O que me chama a atenção é está lógica de leitura adulta. Estas fábulas são infantis, mas lidas nas entrelinhas tratam de assuntos extremamente densos e muitas vezes polêmicos. O que dizer de O Mágico de Oz (the wizard of Oz) ou Alice no País das Maravilhas (Alice in wonderland)? A abordagem seria proibida em algumas culturas, fosse um pouco mais evidente

Seriam nossas crianças subestimadas ou nossos adultos superestimados?

Qualquer das respostas demanda um sinal de alerta.


1 de junho de 2012

JOHNNY VAI À GUERRA


Imagine estar cego, surdo e mudo. Ter seus olhos, orelhas, dentes, maxilar, braços e pernas arrancados. Passar seus dias, nestas condições, servindo como experimento médico. Ser escravo da mente, sã, de suas memórias e sentir o que se passa à sua volta, sem poder reagir. Imagine que os médicos ao seu redor têm a certeza de que você sofreu danos cerebrais e que nada sente, nada percebe, nada sabe. Seu único movimento, balançar a cabeça, é visto como involuntário. Nem mesmo o suicídio é uma opção.

Esta tragédia absoluta é a história de Johnny Vai à Guerra (Johnny got his gun), novela de Dalton Trumbo que posteriormente foi adaptada por ele mesmo e tornou-se um roteiro cinematográfico que, curiosamente, foi dirigido também por ele.

Seu único trabalho como diretor. Uma obra-prima como poucas.

Conhecendo a história do realizador fica bastante compreensível o significado por trás deste filme notável.

Roteirista de sucesso, Trumbo foi perseguido pelo Macarthismo e adentrou a lista negra de Hollywood. Como bem observou Jean Tulard, deve-se a Kirk Douglas seu retorno ao cinema quase treze anos depois. Pelo menos, utilizando seu nome verdadeiro.

Durante este período de suposta inatividade, Trumbo escreveu diversos roteiros e inclusive venceu dois Oscar por A Princesa e o Plebeu (roman holiday) e Arenas Sangrentas (the brave one), ambos creditados a outros cineastas. Posteriormente, graças a Douglas, Trumbo foi identificado como o verdadeiro autor.

Johnny é Trumbo. O homem que foi calado, impedido de escutar, de observar e de trabalhar diante de uma sociedade cuja paranóia amputou sua lógica e sua sanidade. O homem que, em 1971, teve coragem de criar o personagem que mostra, afinal, que somos todos experimentos de uma ganância monstruosa e irrefreável. Que somos todos o resultado de uma mentalidade à busca de sua própria extinção.

Certa vez, Carl Jung escreveu: “O homem saudável não tortura os outros – geralmente são os torturados que se tornam torturadores”.

Resta saber se Trumbo deve ser lembrado por seu talento ou por sua coragem.