31 de julho de 2012

THE DARK KNIGHT RISES - REVIEW


A Jornada do Herói, em especial na estrutura trágica Grega, conta com um elemento capaz de tornar guerreiros e conquistadores em meros tolos que ousaram dar um passo além. Este elemento chama-se Hybris.

Sua melhor tradução talvez seja “descomedimento”, mas arrogância não deixa de ser uma palavra bastante próxima de seu significado real.

Um bom exemplo é a saga de Ícaro.

Preso em um labirinto com seu pai Dédalo, Ícaro tinha apenas um objetivo: escapar e reconquistar sua liberdade. Juntos, pai e filho construíram asas com penas de gaivota e cera de mel de abelhas e as acoplaram nos braços. Assim poderiam voar para longe.

Mas isso não foi o suficiente. Ícaro foi tentado pela Hybris e quis voar cada vez mais alto. Foi além de seus objetivos e, por arrogância, foi destruído. Ao voar muito próximo do sol, a cera que colava as penas derreteu e Ícaro caiu em meio ao mar Egeu.

O mesmo poderia ter acontecido a Christopher Nolan.

Após o sucesso irrepreensível de crítica e público alcançado por O Cavaleiro das Trevas (the dark knight), o realizador parecia ter posto um ponto final na saga do Homem-Morcego, ao menos por suas mãos.

Mas os estúdios queriam mais.

Difícil abandonar a sequência de um filme que alcançou a marca de um bilhão de dólares de renda. Fosse bom ou ruim o terceiro episódio, o lucro seria garantido.

Então Nolan foi tentado pela Hybris.

Eu posso imaginar o que passou em sua cabeça: “Se eu fracassar, corro o risco de destruir o triunfo artístico de seu antecessor. Seria uma mancha em minha carreira. No entanto, se eu triunfar, poderia me tornar um mito”.

Ele conseguiu.

O Cavaleiro das Trevas Ressurge (the dark knight rises) é uma experiência cinematográfica poderosa.

Eu tive a oportunidade de assisti-lo na sala Imax e admito que me senti como um garoto em sua primeira sessão de cinema.

Bane pode não ser um antagonista tão icônico como foi o Coringa, mas este último episódio da trilogia se supera em praticamente todos os quesitos.

A abrangência de sua trama e o cuidado com os detalhes em todos os elementos tornam difícil um filme de ação ter a ousadia de estrear em tempos vindouros. A obra já é um marco e certamente fará com que estúdios e realizadores repensem o que significa fazer cinema nos dias de hoje.

As sequências de ação auxiliadas pela trilha e pelos efeitos sonoros (nunca ouvi nada igual) refletem a realidade do que é ir ao cinema: desligar-se do que ocorre à sua volta.

Eu assistia a uma sessão quase lotada e não escutei ruídos ou conversas paralelas. O público estava hipnotizado.

Mesmo os diálogos em tom épico, que servem para integrar o espectador de detalhes que, se não descritos verbalmente nos fariam perder minutos preciosos, funcionam. São rápidos, diretos e não procuram se esconder entre cortes bruscos e movimentos imprecisos de câmera.

Nolan voou além e deixou bem claro que não existe qualquer possibilidade de haver um quarto episódio. Como disse Pelé, em uma das poucas frases felizes de sua vida: “Saber a hora de parar é uma arte”.

Para nossa sorte, ele não parou no anterior.


23 de julho de 2012

THE DARK KNIGHT RISES


Devido ao lamentável ato de brutalidade ocorrido em uma sala de cinema no Colorado, os números das bilheterias norte-americanas foram divulgados com atraso, por respeito às famílias das vítimas.

Eu, honestamente, não vejo como isso pode significar sinal de respeito. Mas muito do que acontece nos dias de hoje é um total mistério pra mim. Desta maneira, prefiro não opinar sobre o assunto.

Assim, hoje, Segunda-feira 23/07 o site IMDB divulgou a lista dos dez filmes mais assistidos neste último final de semana.

Como era de se esperar, Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge (the dark knight rises) não teve problemas para alcançar o primeiro lugar. Não bateu o recorde de Os Vingadores (the avengers), mas tornou-se a maior renda em um final de semana de estréia de um filme 2D que, como todos sabemos, demanda ingressos mais baratos que os que possuem tecnologia 3D.

Mas este não é o aspecto principal.

Críticos e espectadores ao redor do país, em sua grande maioria, afirmam que este novo episódio é muito superior ao badalado O Cavaleiro das Trevas (the dark knight).

Christopher Nolan parece ter conseguido a façanha de desbancar seu antecessor, fazendo deste terceiro episódio um triunfo artístico de proporções magnânimas ao gênero.

Na próxima Sexta-feira, 27/07, o filme, afinal, fará sua estréia no Brasil.

Até lá, resta crescer as expectativas para ver até onde vai o toque de Midas de Nolan.


20 de julho de 2012

PARIS, TEXAS


Existe algo de comunicativo na pornografia.

Os garotos que procuram tomos da revista Playboy no fundo das gavetas de seus pais ou que pedem para os irmãos mais velhos alugarem vídeos eróticos estão procurando um elo entre gerações. Uma espécie de rito de passagem. A criança iniciando a caminhada para a vida adulta. A adolescência, em termos simples.

Quando eu era moleque, fazia fichas em videolocadoras distantes da minha casa para não correr riscos de encontrar conhecidos. Passava horas na sessão dos filmes de terror (bem ao lado da sala privada que continha o objeto de desejo) e quando o local estava vazio, pegava uma fita qualquer. Passava pelo balcão sem olhar para o atendente. Se fosse uma mulher, aliás, ia embora sem levar nada. Carregava o filme para casa embrulhado em um saco de padaria e fazia uma cópia, de um videocassete para outro. Era uma aventura. Depois, eu e meus amigos compartilhávamos nossas preciosidades.

Hoje, com a internet, tudo ficou mais fácil.

Todo adolescente procura pornografia. Ser jovem não é nada fácil. E é um desejo inato do ser humano. O sexo fará parte da vida de todos.

A violência não.

A morbidez não é uma necessidade fisiológica. A procura pela morte, acidentes ou notícias chocantes mais me parece uma doença da sociedade moderna. Dizem que o ser humano é violento por natureza, mas basta estudar a estrutura matrilinear, muito anterior à idéia de civilização que temos nos dias de hoje, para saber que tudo não passa de pura especulação.

Mas a violência está entre nós e tornou-se uma obsessão, uma perversão, melhor dizendo. Filmes como Jogos Mortais (Saw) tem censuras mais liberais que filmes pornográficos. Implicitamente, queremos dizer que desfrutar de atos de violência descabida não é tão prejudicial quanto assistir a um casal transando.

Honestamente, o sexo, por mais banalizado que tenha se tornado, nunca será tão doentio quanto uma tortura, por exemplo.

Indiferente a isso, a mídia mistifica a violência, transforma fatos isolados em rotina, dramatiza o sofrimento alheio e vende morte como produto.

Bem vindo ao mundo snuff.

Nestes momentos de reflexão eu percebo como o cinema é uma forma de comunicação poderosa.

Ao assistir uma obra como Paris, Texas (idem) fica fácil perceber como tudo o que há de supérfluo se desfaz e o mundo adquire uma feição especial. Como se houvesse um espaço reservado para cada obra-prima.

E existe algo de sublime neste afresco de Wim Wenders.

Não há uma estrutura comum ao tradicional. Existe este homem, interpretado de forma quase lírica por Harry Dean Stanton, que surge, em meio ao nada, e sua presença cria um conflito com o mundo comum. Deslocado, curiosamente tudo o que ele procura é voltar a fazer parte deste universo. Deste quadro que, por alguma razão, ele deixou para trás e hoje percebe que nele está o que há de melhor em si.

A pureza está no aspecto da bondade. Travis (Harry) reencontra seu irmão, Walt, que o tinha como morto, pois ele estava desaparecido há quatro anos. Walt adotou seu sobrinho, filho de Travis, quando este o abandonou ainda criança. Quando Walt percebe que Travis pode querer reconquistar seu filho, ele nada faz para impedi-lo. Pode parecer injusto. Ele cuidou do garoto quando este nem mesmo tinha notícias de seu pai e o criou como se fosse um filho seu. Mas Travis busca sua redenção e o fato de não haver um conflito inerente cria uma beleza particular ao enredo.

Existe algo de ruim no passado. Uma sucessão de fatos, uma coincidência de ações, um mau alinhamento dos planetas, que levou estas pessoas a estarem onde estão hoje. Mas o passado está enterrado. Estamos no presente e este homem será tão honesto em suas ações, ele fará tudo de uma maneira tão correta que os dicionários poderiam usar seu rumo para simplificar o verdadeiro significado da palavra redenção. Mesmo os que buscam conflitos, os que tendem a achar que está tudo fácil demais, ficariam incomodados se algo de errado ocorresse em sua missão.

Travis é o modelo que deveria ser exemplo a uma sociedade moderna. Um verdadeiro herói. E todos à sua volta, com toda sua simplicidade, seriam seus complementos essenciais.

O mundo pode parecer um lugar estranho por vezes, mas filmes como Paris, Texas me fazem acreditar que a opinião simplesmente não é unânime.


17 de julho de 2012

VALENTE


Dificilmente a Pixar irá reencontrar a originalidade e a ousadia de um Wall-E (idem) ou a qualidade nostálgica da série Toy Story (idem). Feitos raros, não apenas no universo das animações, mas também na história da arte em si. Pontos altos e memoráveis, um legado que se estende e se completa.

Assim a história segue.

Alguns elementos, no entanto, permanecem e aperfeiçoam-se obra a obra. O maior deles talvez seja a atenção aos detalhes.

A riqueza das imagens e a importância dos elementos em cena criam um universo magnífico e pessoal. Somente Kung Fu Panda (idem) foi capaz de fazer frente a este grupo de criadores, pelo menos neste quesito. Mesmo Carros 2 (cars 2), ponto fraco de sua filmografia, apresenta sequências com um nível de perfeição tão alto que valem a atenção observando suas pinceladas.

Valente (brave) me parecia uma incógnita. Não no aspecto visual. Basta ver a cabeleira de Merida espalhada ao vento para notar a assinatura da qualidade. Eu digo referente à história que é, ao final, o grande atrativo. Apesar de ter como distribuidora a Walt Disney Pictures, a Pixar tem liberdade criativa total. Fosse o contrário, Ratatouille (idem) jamais teria sido realizado da forma como conhecemos. O que dirá o já citado Wall-E.

Mesmo assim, uma princesa, um reino encantado, uma história baseada em fábulas e mitos, canções, bruxas... A Disney estaria em casa.

Para a nossa sorte, não esteve.

Valente não é uma comédia hilariante, mas agrada por ser intrigante, meticulosamente dosado e simples em sua complexidade. A história confundiria as crianças, não estivesse camuflada por um magnífico visual, boas cenas de ação e um humor fácil.

Fácil não no sinônimo de ruim, mas voltado para sentimentos primários. O velho pastelão, na linguagem comum. A movimentação dos personagens e suas excentricidades (muitos estereótipos) funcionam bem. Existem elementos bastante sofisticados, mas devemos lembrar sempre que o público alvo é o infantil. Desta maneira, nada como quedas e humor adaptável. Muitas vezes mais difícil que o refinado.

Sempre que vou assistir a um filme deste porte observo as reações do meu filho. E eu fiquei bastante apreensivo ao término. Não me parecia algo que interessasse a uma criança de cinco anos.

Para minha surpresa ele saiu extremamente satisfeito, eu também.

Deduzo que, por essa razão, é uma boa obra.

Certamente irá surpreender muitos desconfiados.


13 de julho de 2012

PARA ROMA COM AMOR


“Bom, mas não o melhor Woody Allen”.

Estas frases feitas, a velha lenga-lenga por trás de críticos que não vêem nada de novo pode ser cansativa. Não, não é o melhor filme de Woody Allen. E daí? Ninguém disse que seria. Nós não vamos ao cinema para ver o melhor Woody Allen, mas para ver o que ele tem de melhor.

Há uma grande diferença.

Uma grande diferença que comprova que juventude e perspicácia ainda não são capazes de superar o talento inato. Hoje, aos 76 anos, Woody Allen ainda apresenta mais frescor e um senso agudo de observação superior aos jovens visionários. Por esta razão, a espectadora ao meu lado, por volta de seus 80 anos, eu diria, ria junto comigo.

Os problemas do mundo, a chave da comédia, soam de forma igual para todos quando apresentados sob a acidez do sarcasmo.

Para Roma Com Amor (to Rome with love) introduz o conhecido lirismo do realizador de forma bastante diferenciada. Em meio a fatos comuns, elementos misturam-se e criam uma atmosfera que a principio pode parecer trivial, mas aos poucos demonstra fazer parte apenas das regras deste jogo em particular.

É o mundo feérico colidindo com a rotina.

Sempre quis ver Roberto Benigni e Woody Allen juntos. Apesar de não contracenarem entre si, fiquei plenamente satisfeito com o resultado.

Aliás, voltar a ver Woody Allen à frente das câmeras e não apenas por trás delas já é um deleite. E seu personagem realiza feitos os quais nem mesmo o mais atordoado dos roteiristas de Monty Python seria capaz de conceber.

Engana-se quem o considera um pseudo intelectual demasiadamente sofisticado e por muitas vezes pedante. Eu não sou autoridade em assunto algum e considero seu humor um prazer raro.

Querem ver o melhor Woody Allen? Vejam-no por completo.  


1 de julho de 2012

A ERA DO GELO 4


A Era do Gelo 4 (ice age: continental drift) teve sua estréia em solo nacional no último dia 29. Os norte americanos terão de esperar duas semanas mais.

Alguns anos atrás, este era um fato incomum. Nos últimos tempos, no entanto, diversos estúdios chegaram à conclusão de que utilizar a recepção do público e críticas favoráveis vindas de fora como ferramentas de marketing pode funcionar muito bem. Com Os Vingadores (the avengers) foi assim. A expectativa aumentou muito e certamente colaborou para o filme bater o recorde de bilheteria em um final de semana de estréia.

Com este novo episódio de A Era do Gelo o tiro pode sair pela culatra.

Os comentários são desfavoráveis (alguns até bastante incisivos) e a expressão do público, pelo menos na sessão à qual eu estive presente, foi de decepção. Por diversas vezes eu escutei meu filho dizer: “Eu não estou gostando muito”, o que na linguagem dos adultos significa que o filme é péssimo.

Eu não diria de todo ruim. Mas a estrutura narrativa é realmente terrível.

Existem piadas muito boas, mas quase todas voltadas para o público adulto. E pior, o ritmo é oscilante. As sequências de ação são mal elaboradas e os momentos cômicos isolados. A história paralela à aventura do trio de amigos chega a ser um desaforo à inteligência das crianças. A apresentação dos personagens é demasiada hesitante e a maior parte destes muito mal explorada. Já que Crash e Eddie aparecem pouco e não há um elemento cômico ao estilo Buck, sobra para Sid conduzir a comédia. Ele tem os melhores momentos, é bem verdade, mas não o suficiente para manter a história interessante.

O desastre maior, no entanto, fica para o final.

O termo Deus Ex-Machina foi criado na Grécia e significa algo como Deus Surgido da Máquina. É um artifício teatral, mas que já foi muito utilizado no cinema. Basicamente ele surge quando o escritor/roteirista não consegue criar um gancho para dar continuidade à sua trama, ou não descobre uma forma de criar um desfecho para sua história. Surge então uma força sobrenatural (Deus, por exemplo) que age diretamente contra ou a favor de um personagem. Na Grécia antiga eram bonecos movimentados por uma maquinaria, daí surgiu o termo. Na maior parte das vezes, no entanto, este truque é camuflado. Por exemplo: o herói está encurralado e o vilão aproxima-se para matá-lo. Não há saída. Então, cai um meteoro do céu e mata o vilão. Utilizar a casualidade é interessante, mas quando ela se torna um elemento crucial fica claro que o que aconteceu na realidade foi uma grande falta de criatividade, para não dizer preguiça. Isso acontece ao final de A Era do Gelo 4. Não vou dizer como para não estragar a surpresa, mas está lá.

Como balanço geral, é um programa mediano que pode agradar um público pouco exigente.

Pelo menos por algum tempo.