4 de maio de 2012

PRECISAMOS FALAR SOBRE O KEVIN



Todo mundo conhece a tragédia ocorrida em Columbine. Este blog não tem o intuito de abordar nenhum tema de forma sensacionalista, por isso não vou resumir os fatos ocorridos. Na ocasião, a mídia focou sua abordagem nos sobreviventes, em suas famílias e, principalmente, nas famílias das vítimas fatais. Estrutura óbvia.

Mas e os pais dos garotos que cometeram tamanha barbárie? O que aconteceu em suas vidas? Suas relações dentro da comunidade? Seu dia-a-dia, no trabalho, o relacionamento com os pais de outros alunos... Tornaram-se vítimas? Culpados? Foram alvos de compaixão ou de ódio?

Esta parece ser a premissa de Precisamos Falar Sobre o Kevin (we need to talk about Kevin). É um ponto de partida interessante. Controverso, nebuloso e polêmico. Mistura fatores externos e conflitos internos bastante complexos.

Para entender esta relação, no entanto, devemos partir do ponto de vista de um destes personagens. Aqui, o fato é totalmente fictício: um garoto de dezesseis anos (Kevin) entra em sua escola e passa a atirar em seus colegas a esmo. Mata alguns, fere outros tantos e provoca pânico generalizado. Parecido com Columbine. A diferença é que se trata de apenas um jovem e ele não comete suicídio após o feito.

O personagem escolhido como foco desta narrativa é sua mãe, Eva. Ela será o centro de todo o desenvolvimento dramático.

Voltamos no tempo para entender: quem é esse rapaz? Quem é sua mãe? A princípio tudo se torna bastante claro: é um relacionamento tempestuoso. Kevin, desde o berço, torna-se o símbolo da destruição da liberdade de Eva. Posteriormente, ele toma a mãe como alvo de um ódio incondicional. O conflito se intensifica já que Kevin nutre um relacionamento bastante carinhoso (e artificial) com o pai. Não é a primeira nem será a última família a ter este tipo de problema. Aliás, bastante comum de uma maneira geral.

O curioso é que, após o rapaz cometer tal atrocidade, sua mãe visita-o na cadeia e demonstra uma compaixão antes inexistente.

Mudamos o foco: a catarse faz aflorar o sentimento contido. Outro tema bastante interessante.

Mas é neste ponto que o filme desanda.

Alguns teóricos afirmam que todas as sequências necessitam de um conflito para tornaram-se interessantes. O roteirista levou este conceito a sério. Mas ele se esqueceu de relevar um fato: este conflito precisa ser complementar ou levantar um aspecto até então não explorado. Ele não deve se repetir cena a cena. É isso o que acontece. Todas as situações iniciam e terminam da mesma forma intensificando o mesmo princípio. Alguns simbolismos, inclusive, são tão óbvios que chegam a insultar a inteligência do espectador.

Ao final, as razões que levam Kevin a pôr em prática o massacre são tão banais que se tornam irrelevantes. Se este acúmulo de clichês é o suficiente para incitar a ira de um psicopata, deixá-la sem explicação teria um impacto ainda mais intenso e honesto. A falta de um motivo racional levaria o medo a seu ápice. Seria uma solução simples, mas funcional.

Alfred Hitchcok disse certa vez: “Faça com que o vilão cative o público e você terá um bom filme”. Ele estava certo. Aqui, no entanto, os personagens são pálidos e inexpressivos e encontram-se aquém de nossa importância. Quando não ocorre esta conexão com os conflitos internos destes personagens, qualquer ação torna-se indiferente. Vê-los cometer um assassinato ou ganhar na loteria resulta em um impacto semelhante: a mera sensação de que nada de importante ocorreu.

No início do filme, a casa de Eva sofre o ataque de arruaceiros que mancham suas paredes de vermelho. O símbolo é bastante óbvio. As passagens de cena a mostram esfregando e pintando na tentativa de apagar as manchas. Mas a metáfora é clara: suas mãos estarão sujas para todo o sempre. Nada que ela faça será capaz de limpar este rastro de sangue. Ela está condenada.

Assim também é o cinema: você pode assistir a um filme repetidas vezes. Pode montá-lo, remontá-lo, excluir, incluir, modificar a trilha, a ordem, inserir efeitos, trabalhar a intensidade de cor, polir, ilustrar... Enfim. São centenas, talvez milhares de opções. Deve-se levar em conta, no entanto, que se o conteúdo for vazio, você jamais encontrará artimanhas suficientes para preenchê-lo.





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