26 de março de 2012

TÃO FORTE E TÃO PERTO


Os ataques ocorridos ao World Trade Center no dia 11 de Setembro de 2001 não podem ser comparados ao holocausto, à bomba de Hiroshima ou aos atos criminosos cometidos pelo regime comunista na extinta União Soviética. Por quê então esta tragédia causou um impacto de tamanha intensidade?

Obviamente, foi o símbolo máximo do capitalismo e da hegemonia econômica norte americana que tombou ante aos pés de uma população que apenas assistia à espera do desfecho inevitável. Foi um ataque, não somente a um país, a uma ideologia, a uma política, mas também à tão sonhada e celebrada terra da liberdade.

Mas aqui, há algo maior. Nunca uma tragédia havia sido manipulada ao vivo pela mídia de forma tão sensacionalista. De longe, em diversos prédios espalhados pela região, dezenas de milhares de pessoas viam as torres em chamas. A fumaça densa, a movimentação da polícia, das ambulâncias, dos bombeiros. Em paralelo, milhões assistiam pela televisão e puderam ver, em tempo real, o segundo avião chocando-se e revelando que, afinal, era tudo real. Ocorreram telefonemas de dentro dos escritórios. Pessoas desesperadas tentando entrar em contato com seus familiares para dar um adeus. Tudo foi visto, repetido, gravado e analisado como se não passasse de um devaneio, de pura ficção.

Isso explica porque nunca uma obra cinematográfica foi a fundo neste evento. Como competir com as imagens reais? Com a expressão de desespero da população? Com a correria, os gritos e os prédios explodindo e tombando sobre o centro de Manhattan? O único filme que conseguiu ir além das imagens foi Fahrenheit 9/11 (idem) de Michael Moore, mas estamos falando de um documentário. A sétima arte jamais teria forças suficientes para competir com um evento tão forte e tão perto.

Este é, aliás, o nome da obra a ser comentada. Baseada no livro de Jonathan Safran Foer, Tão forte e tão perto (extremely loud & incredibly close) caminha neste campo minado que é o famoso September eleven. Na verdade, este marco na história norte americana é apenas pano de fundo para que conheçamos Oskar Schell, um garoto que sofre da síndrome de Asperger e que perdeu seu pai, na ocasião, em uma reunião no World Trade Center. Para quem não conhece, a síndrome de Asperger é uma espécie de autismo, onde seus portadores têm enorme dificuldade de interação social, raciocínio extremamente lógico, comportamento obsessivo, repetitivo e uma memória numérica extraordinária.

Oskar é filho de Thomas (Tom Hanks), um joalheiro que o vê além da síndrome. Ele foca nos aspectos positivos do garoto e o faz explorar seus medos e suas virtudes de uma forma bem humorada, carinhosa e descontraída. O relacionamento dos dois é de uma intensidade rara. Após a morte do pai, a estrutura familiar simplesmente entra em ruínas. Tanto Linda (Sandra Bullock), esposa de Thomas, quanto Oskar, vêem o alicerce de sua felicidade partir. Oskar guarda as mensagens gravadas na secretária eletrônica no dia do falecimento do pai. São seis gravações que intensificam-se uma a uma, até que Thomas percebe o inevitável e desespera-se do outro lado da linha. Oskar escuta as mensagens diariamente imortalizando seu martírio. É quando, por um mero acidente, o garoto encontra uma chave dentro de um envelope com o nome Black escrito em azul. Inconsolável, vê-se diante de um objetivo: procurar a fechadura. Esta fechadura abrirá uma porta e ele então terá uma resposta, um sentido para o ocorrido com o pai.

Oskar vai atrás de todas as pessoas cujo sobrenome Black ele encontra na lista telefônica. O garoto inicia uma jornada que, na verdade, é puramente simbólica. Assim como em A invenção de Hugo Cabret (Hugo), a chave tem apenas um objetivo: abrir e libertar seu coração de toda dor. Em meio a seu caminho, ele conhece o personagem aqui chamado de O inquilino, interpretado de forma magistral por Max Von Sydow. Mudo, ele comunica-se com o garoto escrevendo em um papel. Em um curioso momento, Oskar diz uma frase que resume basicamente como anda sua vida: "Apesar de você não falar, esta é a única conversa real que eu tive com alguém em muito tempo".

O filme desenrola-se e muitas surpresas acontecem. Principalmente quando Linda torna-se o foco da narrativa. Desta forma o filme, o que não parece a princípio, torna-se uma jornada de auto descobrimento para que ocorra a criação de um elo de afetividade entre mãe e filho, duas almas separadas por um abismo de emoções.

Termina a sessão.

Dezenas de mulheres enxugam suas lágrimas, alguns homens levantam-se sorrindo, outros estão claramente emocionados. E aí é que está o problema. O filme de Stephen Daldry desperta sentimentalismo, mas não sentimento. Existe uma grande diferença entre os dois. Sentimentalismo é o reencontro dos amantes em Titanic (idem), sentimento é o arrepio da sequência final de Um sonho de liberdade (the Shawshank redemption). O primeiro envelhece e é esquecido com o tempo, o segundo permanece imutável.

A habilidade do diretor em criar belas imagens e de utilizar a montagem e os cenários a favor da história é bastante clara. Infelizmente, tudo não passa de uma sucessão de clichês. Em um determinado momento, incoscientemente, é possível prever cada passo da história, pois tudo já foi visto, mais de uma vez. É fato que o trabalho com os atores é louvável, em especial com Thomas Horn que dá vida a Oskar. Mas é necessário mais que boas atuações para construir uma obra consistente.

Identificar o objetivo do filme e o que move os personagens é bastante fácil, difícil é criar uma identidade, uma conexão com tudo o que ocorre.

Ao final, Tão forte e tão perto é apenas um devaneio vago, que poderia ser definido pela perplexidade da população de Nova Iorque no dia 11/09/2001. Ninguém sabia como definir seus sentimentos, como reagir, o quê fazer. É compreensível. O que não é compreensível é utilizar a sétima arte para uma análise tão rasa e descompromissada e mostrar-se inferior à própria mídia, que nunca teve o compromisso de nos fazer pensar.

Uma pena.  

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