28 de março de 2012

HISTÓRIAS CRUZADAS


 
Jackson, Mississipi, década de 60. A guerra do Vietnã e a luta pelos direitos civis tornam a América do norte um cenário nebuloso da transição de uma mentalidade ultrapassada para uma nova geração bastante contraditória e questionadora. Hippies, beatniks, macartistas, comunistas, socialistas, democratas, republicanos... O combate intelectual e espiritual mostra-se ainda mais intenso que os campos de batalha regados a drogas, torturas e loucura.

No sul dos EUA, no entanto, a vida segue de forma curiosa, como em um conto de fadas alucinado, narrado de uma maneira surrealista e linear. Afro-descendentes e caucasianos (apenas para ser politicamente correto) estão claramente divididos entre propriedades e proprietários. Existem entradas especiais para os negros e lugares separados no ônibus, entre outros tantos detalhes bastante óbvios que, curiosamente, teimam em aparecer de tempos em tempos, inexplicavelmente.

Apesar da violência física não ser tão explícita, salário mínimo e benefícios são negados, por lei, para a classe “de cor”, localizada em uma região própria, longe dos olhos brancos da sociedade.

É quando entra em cena Skeeter Phelan (Emma Stone). Skeeter simboliza a evolução da mentalidade humana, a comprovação da importância social da mulher. Solteira, empregada, inconformada com uma rotina cercada por festas beneficentes e reuniões superficiais. Ela busca algo mais que um casamento e uma vida confortável em clubes campestres.

Depois de passar quatro anos fora do estado cursando a universidade de jornalismo, Skeeter percebe o quanto sua cidade natal estagnou-se em seus próprios vícios e como suas amigas de adolescência tornaram-se o símbolo de toda sua repulsa pela velha América.

É quando ela decide entrevistar todas as babás, empregadas domésticas e cozinheiras, no intuito de publicar um livro narrando o contraste entre a luta pelos direitos civis e o regime de semi-escravidão que vivem os negros neste pedaço do sul do país.

Obviamente, problemas surgem e a trama se desenrola.

Histórias cruzadas (the help) não é uma crítica profunda à psique da sociedade norte americana. A intenção do diretor não é a de se aprofundar nesta ferida antiga que teima em não cicatrizar. Não existe violência visual. O debate aberto procura se focar neste grupo de mulheres que desafia a lei e o ódio social à procura de uma alternativa, ou de plantar uma única semente que possa dar início a uma revolução, por menor que seja.

Não é um grande filme, mas é interessante, o que já o faz maior e melhor que muita coisa produzida nos últimos anos.

Talvez a ausência de imagens chocantes seja uma forma de introduzir à juventude uma questão que está longe de ser resolvida: a questão cultural. Como é difícil livrar-se de uma mentalidade que se baseia em um alicerce construído e semeado pela ignorância durante séculos. É parte do sangue de uma civilização, de sua estrutura genética.

Mais do que isso, é um filme que vai além do preconceito racial. Ele propõe-se também a relevar, sob diversos aspectos, o papel da mulher na sociedade moderna. Outro assunto que está longe de encontrar seu desfecho.

No final, às vezes de forma ingênua, às vezes de forma errônea e por outras com extrema sensibilidade, o elenco femino é tão sincero e tão intenso que nos permite indagar se de fato existe uma linha tão clara entre ficção e realidade.

Como combater um ódio que ultrapassa barreiras em busca de uma vingança contra um instinto que se origina de nossos medos mais íntimos?

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