21 de junho de 2012

VENDREDI SOIR


O cinema francês é recheado de diálogos. A impressão que se tem, assistindo à maior parte dos filmes vindos de lá, é a de que tudo ruma para a filosofia, ou para o amor. Um copo vazio não é somente um copo vazio, mas um universo repleto de angústia. Ou pode também significar uma mulher submissa a regras sociais buscando sua verdadeira paixão.

Ou não.

Brincadeiras à parte, o aspecto dos diálogos é verdadeiro. Mesmo os grandes mestres, Renoir, Godard, Truffaut, Resnais, Rohmer, admitiam uma aderência cultural bastante precisa. Ou seja: definir as características marcantes do povo francês, um povo que dialoga continuamente.

Talvez por esta razão o cinema de Claire Denis seja tão curioso.

Vendredi Soir (sem título em português) é, possivelmente, sua obra-prima e talvez o melhor exemplo de sua abordagem.

Mesclando lirismo e imagens repletas de musicalidade, a trama caminha entre poesia e sinfonia e dá igual importância a personagens e cenários. Já em sua introdução, Paris é apresentada com a Torre Eiffel ao fundo. No entanto, o visual não se assemelha ao de um cartão postal. As casas, os fios e a sujeira das paredes praticamente ofuscam o símbolo máximo da cidade luz. A névoa permite apenas uma silhueta da Torre, tornando-a praticamente insignificante diante do quadro como um todo. É uma visão de cima, mas em sua elevação, praticamente horizontal. Vagarosamente as imagens desconstroem nossa idéia do que seria a capital francesa.

Este elemento é essencial.

O filme conta a história de Laure, uma mulher próxima dos quarenta anos que está empacotando seus pertencentes para ir morar com seu namorado. É noite de Sexta-feira e ela é convidada para jantar com um casal de amigos. Há uma greve geral no transporte público e o trânsito está um caos. Está frio. Ela decide dar carona a um homem, uma sugestão da rádio local para acomodar transeuntes nesta situação atípica.

Utilizando uma sensibilidade bastante aguda, a diretora rege o início de um relacionamento entre dois estranhos nesta noite particularmente incomum. Os diálogos são mínimos, os gestos e as expressões nos dizem tudo. Como escreveu Robert McKee: “Não conte, mostre”.

Devo dizer que ele tem razão.

O manuseio das imagens e a belíssima trilha sonora transportam os personagens a um universo mágico. Suas reações nos revelam o aspecto maravilhoso, distante do melodramático, citado primeiramente por Aristóteles.

A sequência onde Laure sai de seu quarto para buscar um cinzeiro é particularmente tocante. Existe muito em comum entre estes dois novos amantes.

Pelo menos pelo espaço de um dia, o mundo parou de girar para contemplar o amor dos dois.

Infelizmente, minha cópia foi, digamos, adquirida de forma genérica. Talvez se os distribuidores brasileiros tivessem o mínimo de preocupação em tentar abranger o gosto do público a situação das videolocadoras não estivesse tão caótica.

Das videolocadoras e do cinema nacional.

Pelo menos dos filmes que estréiam sem nosso conhecimento.


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